sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Entrevista a Manuela Freitas (directora da CPCIL - Centro Português para a Criatividade, Inovação e Liderança)

Na quinta-feira dia 28 de Outubro, a Filipa, a Mariana e a Tânia encontraram-se no Centro Comercial Colombo com a senhora Manuela Freitas (directora da CPCIL) e entrevistaram-na:

1. Há quantos anos trabalha com estas crianças?
Ora, eu comecei a trabalhar nesta área da sobredotação em 1986, já lá vão uns anitos. Na altura foi só o conhecimento teórico, depois comecei a trabalhar mais na prática; fazemos primeiro a avaliação e o contacto com os pais, e depois começamos a fazer programas específicos para elas: programas de férias, programas de fim-de-semana e muitas conferências, fazemos todos os anos uma conferência. Portanto, durante mais ou menos 15 anos tivemos este trabalho, praticamente sozinhos. Depois começaram a aparecer outras associações, como a ANEIS, a associação das crianças sobredotadas no Porto e, entretanto, as coisas foram mudando e já há mais gente a trabalhar no assunto. Só que em termos ministeriais, em termos legais, tem havido um certo desinteresse, ultimamente, em relação a estas crianças e a todas as outras com problemas, por falta de dinheiro e por falta de gente com capacidade.

2. Que trabalho é que a instituição desenvolve?
Hoje em dia fazemos mais avaliação: os pais ligam-nos porque vêem o nosso site. Antigamente íamos muito à televisão, à rádio, etc. De há uns 10 anos a esta parte, como há mais associações, vamo-nos revezando e então às vezes os pais vêem na net e vêm falar comigo. Fazemos a avaliação, depois entramos em contacto com a escola, para saber o que é preciso fazer em relação a cada uma delas.

3. Como é feita a avaliação?
Fazemos testes. Costumo fazer ao contrário do que é normal, gosto de pegar na criança sem saber nada sobre ela e depois aplicar-lhe vários testes seja as matrizes progressivas de Raven, por exemplo, um teste de criatividade, um teste de coordenação motora, etc. Portanto apanhamos normalmente, e depois também na conversa, a parte cognitiva, quer verbal, quer lógico-matemática; apanhamos a parte criativa, das ideias e da realização gráfica; e também a motricidade. Portanto, ela chega, começamos a conversar, “como é que te chamas?” e assim… De uma forma geral, é relativamente fácil de ver; uma criança, mesmo bebé, nota-se bem, quando são aqueles bebés que têm um olhar mortiço e estão ali por estar, e aqueles que estão com os olhos abertos e a olhar para tudo, que absorvem tudo e estão muito mais despertos para a realidade. Naturalmente, vão adquirir muito mais rapidamente conhecimentos e serão muito mais interessados e motivados nas coisas. Depois, vai-se vendo com o desenvolvimento deles, também com a estimulação que possam ter, mais ou menos, de melhor qualidade ou de pior qualidade. Depois, vão fazendo os testes e vai-se vendo se, realmente, estão dentro da média ou muito acima da média.

4. É possível uma criança crescer sem ninguém reparar que é sobredotada?
Se as pessoas estiverem todas a dormir pode, não é? Se tiverem mais em que pensar, se andarem sempre no passeio, se tiverem na cabeça que é tudo normal, em princípio pode. Mas chega à escola e, em princípio, já não acontece isso, porque os professores estão mais habituados a ter um grande número de crianças e logo se apercebem que a criança está a fazer qualquer coisa de diferente em relação às outras. Também aí há muitos professores que são completamente cegos. Muitas vezes, a criança já sabe ler e escreve fluentemente e é capaz de estar um ano inteiro no 1º ano e os professores não notarem. Os outros todos estão a aprender a ler e a escrever e ela faz o mesmo que os outros. Porquê? Porque se o professor é um bocadinho rígido, as crianças acabam por esconder do professor, e não lhes passa pela cabeça que a criança já sabe ler.

5. Quais são os maiores problemas que estas crianças podem vir a revelar?
Aqui na sobredotação há controvérsia: há aqueles que advogam que o sobredotado é aquele que tem as capacidades elevadas em tudo, em todas áreas de uma forma excelente; e há aqueles que advogam que a sobredotação tem vários aspectos: pode ser sobredotado na área cognitiva, criativa, motricidade, liderança, sócio-emocional… O que acontece, normalmente, é que muitas vezes há componentes, ou seja, a criança pode ter uma só área desenvolvida e as outras menos. Portanto, isso depende muito. Eu sempre fui a favor deste tipo de sobredotação porque a minha formação é mais de pedagogia, interessa-me mais o problema das crianças na escola e não problemas mais abstractos. Interessa-me saber como a criança funciona, para a ajudar de uma forma mais harmoniosa. O que interessa é saber quais são as áreas fortes e se tem áreas fracas, tentar desenvolver as fracas para ficarem todas mais ou menos niveladas, e motivá-la através das áreas fortes. Muitas vezes, isto não acontece e, quando não acontece, a criança tem muitos problemas. Por exemplo, uma criança que é muito desenvolvida na área intelectual, vai para a escola e não está a fazer rigorosamente nada, vai ter desmotivação, desinteresse, e isso vai-se acumulando. Se a criança é, por exemplo, muito criativa e intelectualmente deixou-se ficar para trás; a criança gosta muito de desenhar, de ter ideias, de pensar pela sua cabeça, vai ser uma criança que vai ter problemas disciplinares, não vai ficar caladinha e sossegada na sala de aula. Portanto, depende um bocadinho da situação, as crianças são, normalmente, é desajustadas em relação à média. Depois há um outro problema que é, a partir de determinada altura, a criança acha que não vale a pena lutar contra o esquema. Portanto, uma criança que poderia ser extraordinária, acaba por não ser porque se acomoda. De certa forma, a escola limita as suas capacidades.

6. A sobredotação é algo inato ou que se adquire?
Isso é outra grande questão, se é genético ou se é devido às influências exteriores. Cada vez se aponta mais para o ADN, para os genes. A criança, em princípio, geneticamente tem essas capacidades. Portanto, tem muita componente genética e vem normalmente de um progenitor, às vezes pode não ser o pai ou a mãe, pode ser um avô. Depois, essa parte genética é valorizada se tiver um bom ambiente ou fica adormecida se não tiver. Se, realmente, não houver grandes estímulos exteriores, ninguém que fale com ela, que lhe ofereça brinquedos adequados, que a leve a passear e ver coisas, que tenha conversas com uma linguagem correcta e bom vocabulário; naturalmente que a criança fica muito mais passiva. Há sempre as duas componentes, sendo que esta segunda é uma componente que pode vir a mostrar a capacidade mais rapidamente ou não.

7. Como é que se deve lidar com estas crianças?
Depende. Há crianças sobredotadas muitíssimo sociáveis. Às vezes, são tão sociáveis que se tornam, por assim dizer, chatas. Geralmente falam, falam, falam, porque têm muita coisa na cabeça, têm muita informação para dar, muita para adquirir e estão permanente a falar. Às vezes, tornam-se tão chatos que acabam por ser ostracizados. Aí o que é preciso é ajudá-los a ouvir os outros, a não falarem só por si. Agora, há outros sobredotados que são muito introvertidos, são mais tímidos, gostam mais de observar. Aí é preciso ajudá-los a sair um bocadinho da casca e a pô-los em situações em que falem e tenham que apresentar as suas ideias.

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